E mandam recado a Temer
“O desaparecimento do
Ministério da Cultura é considerado pela classe artística como um grande
retrocesso”, diz o texto enviado após o golpe contra Dilma Rousseff
Em carta enviada ao
presidente golpista Michel Temer nesta sexta-feira (13), artistas de diversas
áreas da Cultura brasileira reagiram ao fim do Ministério da Cultura e
demonstraram grande preocupação com o futuro da arte no país a partir de agora.
Após o golpe que afastou a presidenta eleita, Dilma Rousseff, da Presidência da
República, o Ministério da Cultura foi incorporado à estrutura do Ministério da
Educação, sob a condução do também golpista Mendonça Filho (DEM-PE).
O texto endereçado a Temer
apresenta o histórico da importância da pasta desde a redemocratização, aponta
para as perdas inevitáveis para a cultura nacional com a desarticulação do
ministério e indica que a economia com o fim da estrutura será “pífia”.
“É por tudo isso que o
anunciado desaparecimento do Ministério da Cultura é considerado pela classe
artística como um grande retrocesso”, escrevem os artistas na carta. “A
economia que supostamente se conseguiria extinguindo a estrutura do Ministério
da Cultura, ou encolhendo-o a uma secretaria do MEC, é pífia e não justifica o
enorme prejuízo que causará para todos que são atendidos no país pelas
políticas culturais do Ministério.”
Leia
a seguir a carta na íntegra:
“Exmo.
Sr. Michel Temer
Prezado
senhor,
Entre
as grandes conquistas da identidade democrática Brasileira está a criação do
Ministério da Cultura, em março de 1985, pelo então Presidente José Sarney.
É
inegável que, nessa ocasião, o nome do Brasil já havia sido projetado
internacionalmente através do talento de Portinari, de Oscar Niemeyer, de Anita
Malfati, de Jorge Amado, da música de Ary Barroso, Dorival Caymmi, Carmen
Miranda, Tom Jobim e Vinicius de Moraes, do cinema de Glauber Rocha e Cacá
Diegues. Desta forma, a existência do Ministério da Cultura se deve ao merecido
reconhecimento do extraordinário papel que as artes brasileiras desempenharam na
divulgação de um país jovem, dinâmico, acolhedor e criativo.
A
extinção desse Ministério em abril de 1990 foi um dos primeiros atos do governo
Collor de Mello. Abrigada em uma Secretaria vinculada à Presidência da
República, a cultura nacional assistiu ao sucateamento de ideias, projetos e
realizações no campo das artes. Já no final de seu governo, tentando
reconquistar o apoio político perdido, o Presidente Collor adotou outra
postura, nomeando para a Secretaria de Cultura o intelectual e embaixador Sergio
Paulo Rouanet, encarregado de restabelecer o diálogo com a classe artística.
Nasceu assim o Pronac – Programa Nacional de Apoio à Cultura, que se tornou o
elemento estruturante da política cultural dos governos subsequentes, e a
denominada Lei Rouanet. Felizmente o Presidente Itamar Franco, em novembro de
1992, devolveu aos criadores um Ministério que já havia comprovado o acerto de
sua presença no cenário nacional.
A
partir de 1999, durante o governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, o
Ministério da Cultura foi reorganizado e sua estrutura ampliada, para que
pudesse servir a projetos importantes, em especial nas áreas de teatro e
cinema. Desde então o MinC vem se ocupando, de forma proativa, das artes em
geral, do folclore, do patrimônio histórico, arqueológico, artístico e cultural
do País, através de uma rede de institutos como o IPHAN, a Cinemateca
Brasileira, a Funarte, o IBRAM, Fundação Palmares entre muitos outros.
A
partir da gestão de Gilberto Gil, o MinC ampliou o alcance de sua atuação a
partir da adoção do conceito antropológico de cultura. O Programa Cultura Viva
e os Pontos de Cultura são iniciativas reconhecidas e copiadas em inúmeros
países do mundo. O MinC passou a atuar também com a cultura popular e de grupos
marginalizados, ampliando os horizontes de uma parcela expressiva de nossa
população. Foi o MinC que conseguiu criar condições para que tenhamos hoje uma
indústria do audiovisual dinâmica e superavitária. O mesmo está sendo feito
agora com outros campos, como por exemplo o da música.
O
MinC conta hoje com vários colegiados setoriais que cobrem praticamente quase
todas as áreas artísticas bem como grupos étnicos e minorias culturais do país.
E com um Conselho Nacional de Políticas Culturais, formado pela sociedade civil
e responsável pelo controle social da gestão do Ministério. Há ainda que se
mencionar o Plano Nacional de Cultura e inúmeras outras iniciativas com amparo
no texto constitucional e em leis aprovadas pelo Congresso Nacional, cuja
inobservância ou descontinuidade poderão ensejar questionamentos na esfera
judicial.
O
MinC também protagonizou várias iniciativas que se tornaram referência no
ordenamento jurídico internacional, como as Convenções da Unesco sobre
Diversidade Cultural e de Salvaguarda do Patrimônio Imaterial, dentre outros.
A
Cultura de um País, além de sua identidade, é a sua alma. O Ministério da
Cultura não é um balcão de negócios. As críticas irresponsáveis feitas à Lei
Rouanet não levam em consideração que, com os mecanismos por ela criados, as
artes regionais floresceram e conquistaram espaços a que antes não tinham
acesso.
A
Cultura é a criação do futuro e a preservação do passado. Sem a promoção e a
proteção da nossa Cultura, através de um ministério que com ela se identifique
e a ela se dedique, o Brasil fechará as cortinas de um grandioso palco aberto
para o mundo. Se o MinC perde seu status e fica submetido a um ministério que
tem outra centralidade, que, aliás, não é fácil de ser atendida, corre-se o
risco de jogar fora toda uma expertise que se desenvolveu nele a respeito de,
entre outras coisas, regulação de direito autoral, legislação sobre vários
aspectos da internet (com o reconhecimento e o respeito de organismos
internacionais especializados), proteção de patrimônio e apoio às manifestações
populares.
É
por tudo isso que o anunciado desaparecimento do Ministério da Cultura sob seu
comando, já como Chefe da Nação, é considerado pela classe artística como um
grande retrocesso. O Ministério da Cultura é o principal meio pelo qual se pode
desenvolver uma situação de tolerância e de respeito às diferenças, algo
fundamental para o momento que o país atravessa.
A
economia que supostamente se conseguiria extinguindo a estrutura do Ministério
da Cultura, ou encolhendo-o a uma secretaria do MEC é pífia e não justifica o
enorme prejuízo que causará para todos que são atendidos no país pelas
políticas culturais do Ministério. Além disso, mediante políticas adequadas, a
cultura brasileira está destinada a ser uma fonte permanente de desenvolvimento
e de riquezas econômicas para o País.
Nós,
que fazemos da nossa a alma desse País, desejamos que o Brasil saiba
redimensionar sua imensa capacidade de gerar recursos para educação, saúde,
segurança e para todos os projetos sociais e econômicos necessários ao
crescimento da nação sem que se sacrifique um dos seus maiores patrimônios: a
nossa Cultura.
Em
representação da Associação Procure Saber e do GAP–Grupo de Ação Parlamentar
Pró- Música.”
Fonte: www.conversaafiada.com.br
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